domingo, setembro 21, 2008

Homenagem ao morto. (Ou as histórias do Boliche Humano e do Rodeio de Empregada)


Outro dia fui a um velório do pai de um amigo. Definitivamente não é meu programa favorito. Primeiro que a gente nunca sabe direito como se portar. Eu pelo menos não sei. Normalmente não se tem nenhuma intimidade com o morto – quando vivo, obviamente -, mas é necessário fazer um semblante carregado, falar com a família quando não se tem o que dizer, chegar à beira do caixão, olhar o morto como se estivesse lamentando a sua ida. Eu odeio olhar o morto. Nessa hora eu costumo mirar uma coroa de flores e desfoco a imagem do defunto.

Já ouvi casos engraçados sobre velórios e enterros que são fruto do desconforto que as pessoas sentem nestas ocasiões. Uma vez me contaram que uma pessoa foi falar com a viúva e ao invés de dizer “sinto muito” falou “parabéns”. Ouvi também sobre outra que mal conhecia o finado, chegou perto do caixão, olhou, olhou e deu dois beijos no morto, um em cada bochecha, como quem diz “oi, tudo bem?”. É muita piração pra minha cabeça.

Mas, vou voltar ao velório que deu origem a este post. Cheguei a uma das saletas do Jardim da Saudade e cumprimentei meu amigo, sua mãe e seus irmãos. Depois, completamente deslocado, me juntei a uma rodinha de pessoas. Nesse tipo de reunião sempre tem alguém mais saudosista que fica contando histórias do sujeito que se foi. E o pior: o pobre do morto nem pode se defender. Para minha surpresa, as lembranças não eram do tipo “Beltrano era uma pessoa espetacular”, “O céu ganhou mais um santo”, “Poucas são as pessoas iguais a Beltrano”. Um senhor, primo do finado, foi o encarregado da oratória de rodinha de velório. Falava ele em tom solene:

- Beltrano vai deixar saudade. Lembro de quando éramos jovens, ele tinha um Karmann Guia e adorava fazer boliche humano.

Eu que nem estava prestando muita atenção na conversa, me perguntei: será que eu ouvi boliche humano? Uma das pessoas da roda perguntou do que se tratava. Ainda bem, senão eu ia acabar perguntando. O tiozão continuou. Contava como se realmente fosse algo épico:

- A gente voltava das festas de madrugada, o dia amanhecendo. E Beltrano sempre pedia pra fazer boliche humano. Ele ficava em cima do capô do carro, agachado, e eu ia dirigindo. Quando desenvolvíamos uma boa velocidade, eu apontava o carro pra algum ponto de ônibus que tivesse gente e freava de vez. Ele era lançado como uma bola em direção às pessoas e derrubava boa parte delas.

O sujeito contou a história sem rir. Já eu não consegui, dei risada e acabou saindo alto. Foi sem dúvida o hobby mais esquisito que eu já ouvi. Principalmente contado em um velório.

Não satisfeito com sua nobre lembrança do morto, o cara engrenou outra:

- Tinha também o rodeio de empregada...

Não era possível, eu pensava. Ou é pegadinha ou esse cara é doido ou o próprio defunto era pirado. Após uma pequena pausa de reverência ao passado o tio sem-noção continuou:

- Beltrano não podia ver uma empregada andando na rua que pulava nas costas dela e a gente cronometrava quanto tempo ele conseguia permanecer com ela se debatendo.

Não só eu, mas todo mundo começou a rir e a rodinha se desfez, cada um pra um canto buscando evitar constrangimentos. Me despedi de todos e segui em direção à porta de saída da salinha. Desviei os passos e fui até o caixão. Olhei o morto sem sentir agonia, apenas admiração. Pena que não o conheci em vida. Tinha virado fã póstumo de Beltrano.

13 comentários:

Dani disse...

huahuahuahuahua
Não sei quem era mais doido... se Beltrano ou o primo!

Viviane Costa disse...

Gargalhadasssssss! Não pode ser real essa história. Não pode, não pode, não pode. Que loucura!

Anónimo disse...

uhAHuAUHuhauhAhuAuhauhauhAH!

boliche humano é foda! uhauahuahuauhahuauh

Anónimo disse...

Poxa Pedro...passei bons momentos lendo todas essas estórias!
Muito bom!

Márcio

Vivz disse...

Uma vez postei no blog que, qdo via pedestres ousados atravessando fora da faixa, morria de vontade de fazer um strike. Rs... Bjs.

DAVID FRANCO disse...

Sensacional! Tô rindo até agora.

Abraços

Lilian Devlin disse...

Oi Pedro,
Vi um comentário seu no blog da Dedinhos e vim aqui, conhecer seu espaço.E gostei demais da pequena amostra que li,já que hoje tô meio apertada de "costura" e só tive tempo de ler seus dois últimos post.Mas prometo voltar e ler mais!
Essa coisa de dar parabéns em velório aconteceu comigo.Nossa, morri de vergonha, mas acho que no final ninguém ouviu porque tava aquele climão normal, as pessoas meio que anestesiadas, por sorte minha!
Até outro dia e beijos procê!

Lilian Devlin disse...

Pô Pedro, o que poderia ser o começo de uma bela amizade, termina assim na gozação??!! kkk
Pelamordedeus!! Tudo bem que a gente acabou de se "conhecer", mas vai lá, me deseje "coisa" melhor, colabora!!rsrs
Obrigada pela retribuição da visita, adorei!
Bjs procê!

Paula disse...

Pedro, te vi no blog da Lilian e vim aqui te conhecer! Quanto ao velório, conheço um cara que considera isso um verdadeiro programa. Faz questão de ser conivdado! É sério! Uma coisa!

beijos

Dedinhos Nervosos disse...

hahahaahahahhahahahaha
haahahahahahah
Pedro, eu sei que sempre comço meus comentários rindo, mas o que eu posso fazer? Tô em lágrimas aqui, imaginando o cara sendo lançado em cima das pessoas no ponto! hahahaahahahahah

Ainda bem que eu não estava por perto, pq quando começo a rir, eu não paro!

Bjos!

Senhorita B. disse...

Péu,
Você vai acabar me matando com essas histórias tão engraçadas!
Bjs

aeronauta disse...

Puxa, vida! Como você tem talento pra escrever! Me acabei de rir! Seu texto é muito bom!

Pedro disse...

Dani: o finado Beltrano era mais doido. Mas o primo era o típico sem-noção.

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Viviane: essa eu não posso afirmar se é real pois não a vivi com Beltrano. Mas é difícil acreditar que um senhor possa inventar histórias como essas em um velório. A não ser que ele estivesse se vingando do morto por algum motivo.

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Rueda: agora que você está motorizado, não vá inventar de fazer isso.

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Márcio: fico feliz de verdade quando descubro que o blog ajudou a alegrar o dia de alguém. Forte abraço.

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Personagem (Vivz): para o seu tão sonhado strike, você não vai poder contar com o finado Beltrano. Mas vai que o primo topa?

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David: você tá rindo até agora porque não estava no ponto de ônibus nem era uma empregada de rodeio, seu cara de pau.

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Lilian: obrigado pela visita. E cuidado para no próximo velório não cantar "parabéns pra você" em volta do caixão e ainda soprar a vela do defundo. Bjo!

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Paula: me apresenta esse cara que eu já vou deixar ele convidado pro meu. Obrigado pela visita. Bjo!

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Dedinhos: ainda bem que você não estava perto mesmo. Caso contrário, sofreria um strike. Bjo!

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Naty: é muito bom quando alguém que a gente tanto admira nos elogia. Bjo!

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Aeronauta: obrigado! Mas acho que o mérito maior é dos personagens. Tem mais figura no mundo do que a gente imagina... obrigado pela visita. Abraço!