segunda-feira, outubro 12, 2009

Prematura morte de um nacionalista.

Eu não sei vocês, mas eu cansei. Cansei de vestir verde e amarelo na copa, cansei de acordar cedo no domingo pra tentar ver uma bandeira brasileira flamulando no alto de um pódio, cansei de me emocionar ouvindo o hino nacional. Cansei de pensar orgulhoso que somos um povo privilegiado, seja na geografia, na música, na alegria, na criatividade, na tão celebrada diversidade que encanta o mundo. Cansei de tentar me enganar com essa história mofada de país do futuro.

Não somos, não.

Primeiro que, para sermos um país de fato, precisaríamos construí-lo com certas qualidades desconhecidas por aqueles que capitaneiam nosso Estado. Definitivamente, aqui não se constrói, mas, diariamente, se dilapida. A célebre frase de Kennedy - “não pergunte o que seu país pode fazer por você, mas o que você pode fazer pelo seu país” – só é conhecida aqui do avesso. Talvez nossos nobres Kennedys, todos os dias, acordem pensando: “o que é que eu posso tirar daqui hoje?”. Somos a mesma paradisíaca colônia de exploração de 1500. Só que, desta vez, ironicamente, explorados por nós mesmos.

Quem foi abençoado por ter nascido nesta terra adorada, rapidamente encontra o seu propósito de vida: pagar impostos. Nascemos, vivemos e morremos sendo açoitados por uma carga de impostos que luta incessantemente contra o sucesso pessoal de cada brasileiro. Quando eu decidi abrir uma agência de publicidade, ninguém me avisou que, compulsoriamente, eu teria um sócio: o governo. Foi só depois do primeiro DARF que eu comecei a desconfiar que este meu “parceiro” levava a maior parte do que faturávamos.

Eu, você e mais alguns milhões de ingênuos alimentamos diariamente a fornalha desta grande locomotiva que deveria andar em ritmo de trem-bala. Ralamos, pagamos nossos impostos e pensamos: “tudo bem, estou sendo penalizado – e esta é a palavra – com tanto a contribuir, mas estou ajudando a construir um país”. Então, vêm as ratazanas de Brasília e, insaciáveis, engolem com voracidade o fruto do nosso suor. E, disso, eu cansei de verdade.

Eu cansei de bater no peito por conta desse delirante e injustificado orgulho de ser brasileiro. Qual seria mesmo o motivo para isso? Nossas belezas naturais? As mulatas? Ah, talvez seja porque sabemos tocar pandeiro e somos craques de bola. Pois eu, sem pestanejar, trocaria todas as 5 estrelas que carregamos no lado esquerdo do padrão verde e amarelo por um punhado de homens honrados, políticos que fossem compromissados com o bem comum e não com a sua eterna manutenção no poder.

Hoje eu sei por que nosso país não tem tufões, furacões, terremotos, tissunamis e afins: porque Deus é justo. Imagine o furor que as empreiteiras, congressistas, prefeitos e governadores não ficariam toda vez que um destes desastres naturais acontecesse e o país precisasse de reconstrução. A propósito, será que alguém tem algum palpite para explicar por que o nosso projeto para as Olimpíadas de 2016 foi o mais caro das quatro nações candidatas?

Pois é. Tem gente que insiste em dizer que somos um país pobre. Nós temos petróleo que não acaba mais e continuamos descobrindo novos, gigantescos e caudalosos poços. Somos quase um continente inteiro de terras férteis onde se plantando, tudo dá. Em nosso subsolo, temos ouro, diamantes, minério de ferro, pedras semi-preciosas e um sem-número de outras riquezas. Temos a Amazônia. A Amazônia! Vale lembrar que isso tudo não é mérito nosso, é bênção, veio no pacote. São riquezas que o mundo inteiro inveja.

Agora, junte toda esta fartura que a terra nos dá com os impostos que 180 milhões de brasileiros pagam todos os dias. Vamos aos resultados desta fabulosa soma de recursos: insuficientes hospitais públicos sem médicos, sem equipamentos, sem remédios - verdadeiros corredores da morte. Escolas públicas sucateadas, sem merenda escolar para os alunos, sem ensino de qualidade, onde professores mal recebem salário, que dirá qualificação profissional. Estradas e ruas completamente esburacadas, onde apenas um centímetro de espessura de asfalto repousa frágil na terra porque o resto dele foi parar no bolso de algum político que assinou a autorização da obra. Milhões de bairros em milhares de cidades brasileiras com esgoto a céu aberto. Cultura e lazer? Assistência social? Bom, é melhor parar por aqui para que a vergonha, ao invés de ser colossal, seja apenas gigantesca.

Vivemos o triste paradoxo de sermos, ao mesmo tempo, incrivelmente ricos e lamentavelmente paupérrimos.

Cansei de, como povo, ser apenas o meio e não o fim. Desde sempre e até hoje, somos só uma ponte para que os parasitas se instalem nas entranhas dos cofres públicos e de lá não saiam mais. Assim como também cansei de financiar o congresso nacional e ele funcionar apenas como um balcão de negócios de quinta categoria onde mercam-se cargos e benesses pessoais. São milhões e milhões de reais por ano para que estes senhores mantenham-se em seus gabinetes com regalias monárquicas e, além de não legislar em prol do país e sua gente, ainda emperram a máquina, só votando a favor de alguma lei ou projeto caso ganhem algo em troca. (O “algo” pode ser preenchido com o mais largo espectro de coisas).

Eu simplesmente cansei de ver o meu dinheiro tratado como se ele não tivesse dono. Ele tem.

A grana que um homem público passou a mão é um trabalhador, pai de família, contribuinte, que morreu na fila de um hospital porque lá não tinha médico para atendê-lo. O cargo que um senador dá ao namorado de sua neta é o presente de Natal que uma mãe não conseguiu dar a seu filho porque, mês a mês, estava financiando a boa vida de um vagabundo. O suado e sagrado imposto de uma pequena empresa que foi mais uma vez profanado é, simplesmente, mais um jovem brasileiro semi-analfabeto que sai formado da escola pública sem conhecimento, sem perspectiva.

Onde está a beleza de ser brasileiro? Cadê a poesia?

Se você está disposto a procurar, boa sorte. Eu cansei, joguei a toalha. Portanto, fica aqui o registro: eu, Pedro Andrade Valente, RG 05744756-05, um ex-brasileiro, procuro uma pátria sem mestre-sala nem porta-bandeira, sem tamborim, talvez até sem praia, provavelmente sem mata atlântica virgem, um país ruim de bola, mas que, em alguma língua não tão bonita quanto a nossa, dê sentido a duas palavras que, retumbantes, ecoam em minha cabeça: ordem e progresso.

Perdoem-me a falta de humor. Eu queria escrever algo engraçado hoje. Juro que tentei. Mas, há algum tempo, a maior piada com que tenho me deparado todos os dias é, infelizmente, o meu país.