quinta-feira, maio 22, 2014

O misterioso e lamentável desaparecimento de todas as piriguetes do planeta. (Parte II)



            O esforço conjunto mundial seguia em frente. Os países cooperavam, inimigos históricos uniam-se, mágoas antigas eram superadas, passados amargos eram esquecidos.
Não, não era a fome na África, não era o aquecimento global, não era o desmatamento da Amazônia, não era um meteoro ameaçando a espécie humana, não foi uma nova usina nuclear superaquecendo. O motivo de tamanha união e nobreza de espírito era o súbito sumiço de todas as piriguetes do planeta. Durante a saga do homem na Terra, essa foi a única catástrofe capaz de aproximar povos, nações e religiões. Pela primeira vez, era como se o planeta girasse junto, numa só sintonia.
            O tempo foi passando e importantes recursos dos países foram sendo consumidos com a busca desenfreada. Ainda que muitos chefes de estado e parlamentos começassem a fazer oposição às investigações, a maioria esmagadora da população ia às ruas cobrando o fim do mistério e a volta do sorriso sincero nos rostos masculinos. E então seguiu-se assim por muito tempo: dia após dia, quando o sol despontava em cada horizonte, país a país, em todos os continentes, já estavam de pé em busca de respostas. Grandes e inéditas ações foram realizadas com o objetivo de tentar atrair - sem trocadilho - as mulheres perdidas.
            A China, em apenas uma semana, produziu 15 milhões de calças zebradas que seguiram em containers para os 4 cantos do mundo e, a módico preço médio de U$ 4.99, ganharam lugar de destaque em vitrines de todo o planeta.
            Numa fantástica ação casada, a Suécia subsidiou toda a sua produção de Absolut e a Áustria doou histórica quantidade de latinhas de Red Bull que se uniam em combos e eram deixadas em baldes de gelo pelas ruas.
            Toda a frota de navios militares russos foi transformada em navios de cruzeiro universitário com open bar e começavam a atracar nos mais importantes portos do planeta.
Apesar de celebradas por todos os continentes, essas e outras ideias geniais não surtiam qualquer efeito. Infelizmente, as calças mantinham-se empilhadas em intermináveis estoques, ninguém triscava nos combos de vodca além de bêbados em fim de noite e os navios pareciam fragatas e destroieres fantasmas, apesar das enormes placas de “7 dias de micareta no mar” em seus cascos.
Mas, toda essa mobilização era como uma grande maratona. E, como em qualquer maratona, o fôlego dos participantes vai diminuindo ao longo do percurso. Para uns, o fôlego acaba antes, para outros, depois. A questão é que, não por falta de vontade e empenho, mas por falta de opção, países economicamente mais frágeis começaram a interromper suas missões.
Abrindo a lista de desistências, Suriname, Congo, Grécia e Equador. Cuba também deu uma forte balançada, mas Estados Unidos e Rússia, juntos, fiavam a ilha sem pedir nada em troca. Obstinada em descortinar a verdade, a União Europeia tirava recursos de onde, há muito, não possuía. Mas, após algum tempo, temendo o pior, o Velho Mundo também abandonou a busca. De tanto gastar na grande empreitada, de país emergente, o Brasil passou a país submergente e chegou a penhorar o Acre junto ao Japão em troca de crédito e tecnologia para continuar a procura.
O mundo investia alto. Mas, infelizmente, não havia retorno.
Sem qualquer resultado efetivo e dilapidando importantes reservas, um a um, os países foram interrompendo seus esforços. Por último, depois de um persistente trabalho que inspirou o mundo, os Estados Unidos jogaram a toalha e encerraram definitivamente a maior e mais custosa busca que o mundo já presenciou. Porta-aviões, tropas de inteligência, drones de espionagem, zepelins, todo o tipo de aparato militar havia sido utilizado em vão.
No dia seguinte, o planeta acordou com uma grande ressaca. Muito se tinha feito, demais se havia gastado, absolutamente nada foi encontrado. Estampado na capa da Time, em vermelho, o título “WHERE?” por cima de uma foto de Paris Hilton num gigantesco salto verde limão.
Diante de um mundo desolado, desestimulado e deprimido, um sinal de rádio captado por um submarino nuclear russo fez o mundo segurar a respiração por alguns instantes. Uma comissão mundial de militares especialistas em criptografia reuniram-se de emergência na sede da ONU para se certificarem de que aqueles “bips” no radar tratavam-se da resposta que todas as nações esperavam. Microfones hipersônicos captaram um repetitivo padrão de som. Era música eletrônica.
Sim. Tratava-se da grande notícia. A boa nova. O fim das superdosagens de antidepressivos.
Feriado mundial. O planeta celebrava. A Times Square foi tomada de pessoas se abraçando. Tóquio anunciou 3 dias de comemorações não trabalhados. A Rainha Elizabeth abriu os portões do jardim do palácio para uma maratona de shows antes só vista no seu jubileu de ouro. Na Faixa de Gaza, as únicas explosões que se ouviam eram as dos rojões. ACM Neto anunciou o terceiro carnaval do ano. O ex-presidente Lula tomou dois litros de 51.
Em meio à grande confraternização global, as lideranças mundiais ainda aguardavam a explicação sobre o desaparecimento das piriguetes do mundo. O motivo tinha nome: Sunrise Morpheus Unlimited Finally I’m High. Uma rave que há mais de um mês estava acontecendo em Sebastopol, litoral da Crimeia. Estavam todas lá. Milhões de microshorts com os bolsinhos de fora, bonés de aba reta, camisetinhas escrito “Ibiza” e selfies de duck faces sendo disparados por todos os cantos.
Bom, aí o resto da história você já conhece. Municiado dessa preciosa informação vinda de suas fronteiras, Wladimir Putin disse que a Crimeia era dele, Obama disse que não era e cada país do mundo tomou um lado da briga que começou ano passado e parece que não termina até essa rave acabar.

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