Não, não era a fome na África,
não era o aquecimento global, não era o desmatamento da Amazônia, não era um
meteoro ameaçando a espécie humana, não foi uma nova usina nuclear
superaquecendo. O motivo de tamanha união e nobreza de espírito era o súbito sumiço
de todas as piriguetes do planeta. Durante a saga do homem na Terra, essa foi a
única catástrofe capaz de aproximar povos, nações e religiões. Pela primeira
vez, era como se o planeta girasse junto, numa só sintonia.
O tempo foi
passando e importantes recursos dos países foram sendo consumidos com a busca
desenfreada. Ainda que muitos chefes de estado e parlamentos começassem a fazer
oposição às investigações, a maioria esmagadora da população ia às ruas
cobrando o fim do mistério e a volta do sorriso sincero nos rostos masculinos. E
então seguiu-se assim por muito tempo: dia após dia, quando o sol despontava em
cada horizonte, país a país, em todos os continentes, já estavam de pé em busca
de respostas. Grandes e inéditas ações foram realizadas com o objetivo de
tentar atrair - sem trocadilho - as mulheres perdidas.
A China, em
apenas uma semana, produziu 15 milhões de calças zebradas que seguiram em
containers para os 4 cantos do mundo e, a módico preço médio de U$ 4.99,
ganharam lugar de destaque em vitrines de todo o planeta.
Numa
fantástica ação casada, a Suécia subsidiou toda a sua produção de Absolut e a
Áustria doou histórica quantidade de latinhas de Red Bull que se uniam em
combos e eram deixadas em baldes de gelo pelas ruas.
Toda a frota
de navios militares russos foi transformada em navios de cruzeiro universitário
com open bar e começavam a atracar nos mais importantes portos do planeta.
Apesar de celebradas por todos os
continentes, essas e outras ideias geniais não surtiam qualquer efeito. Infelizmente,
as calças mantinham-se empilhadas em intermináveis estoques, ninguém triscava
nos combos de vodca além de bêbados em fim de noite e os navios pareciam
fragatas e destroieres fantasmas, apesar das enormes placas de “7 dias de
micareta no mar” em seus cascos.
Mas, toda essa mobilização era
como uma grande maratona. E, como em qualquer maratona, o fôlego dos participantes
vai diminuindo ao longo do percurso. Para uns, o fôlego acaba antes, para outros,
depois. A questão é que, não por falta de vontade e empenho, mas por falta de
opção, países economicamente mais frágeis começaram a interromper suas missões.
Abrindo a lista de desistências,
Suriname, Congo, Grécia e Equador. Cuba também deu uma forte balançada, mas
Estados Unidos e Rússia, juntos, fiavam a ilha sem pedir nada em troca.
Obstinada em descortinar a verdade, a União Europeia tirava recursos de onde, há
muito, não possuía. Mas, após algum tempo, temendo o pior, o Velho Mundo também
abandonou a busca. De tanto gastar na grande empreitada, de país emergente, o
Brasil passou a país submergente e chegou a penhorar o Acre junto ao Japão em
troca de crédito e tecnologia para continuar a procura.
O mundo investia alto. Mas,
infelizmente, não havia retorno.
Sem qualquer resultado efetivo e
dilapidando importantes reservas, um a um, os países foram interrompendo seus
esforços. Por último, depois de um persistente trabalho que inspirou o mundo,
os Estados Unidos jogaram a toalha e encerraram definitivamente a maior e mais
custosa busca que o mundo já presenciou. Porta-aviões, tropas de inteligência,
drones de espionagem, zepelins, todo o tipo de aparato militar havia sido utilizado
em vão.
No dia seguinte, o planeta
acordou com uma grande ressaca. Muito se tinha feito, demais se havia gastado,
absolutamente nada foi encontrado. Estampado na capa da Time, em vermelho, o
título “WHERE?” por cima de uma foto de Paris Hilton num gigantesco salto verde
limão.
Diante de um mundo desolado, desestimulado
e deprimido, um sinal de rádio captado por um submarino nuclear russo fez o
mundo segurar a respiração por alguns instantes. Uma comissão mundial de
militares especialistas em criptografia reuniram-se de emergência na sede da
ONU para se certificarem de que aqueles “bips” no radar tratavam-se da resposta
que todas as nações esperavam. Microfones hipersônicos captaram um repetitivo
padrão de som. Era música eletrônica.
Sim. Tratava-se da grande notícia.
A boa nova. O fim das superdosagens de antidepressivos.
Feriado mundial. O planeta
celebrava. A Times Square foi tomada de pessoas se abraçando. Tóquio anunciou 3
dias de comemorações não trabalhados. A Rainha Elizabeth abriu os portões do jardim
do palácio para uma maratona de shows antes só vista no seu jubileu de ouro. Na
Faixa de Gaza, as únicas explosões que se ouviam eram as dos rojões. ACM Neto anunciou
o terceiro carnaval do ano. O ex-presidente Lula tomou dois litros de 51.
Em meio à grande confraternização
global, as lideranças mundiais ainda aguardavam a explicação sobre o
desaparecimento das piriguetes do mundo. O motivo tinha nome: Sunrise Morpheus
Unlimited Finally I’m High. Uma rave que há mais de um mês estava acontecendo em
Sebastopol, litoral da Crimeia. Estavam todas lá. Milhões de microshorts com os
bolsinhos de fora, bonés de aba reta, camisetinhas escrito “Ibiza” e selfies de
duck faces sendo disparados por todos os cantos.
Bom, aí o resto da história você
já conhece. Municiado dessa preciosa informação vinda de suas fronteiras, Wladimir
Putin disse que a Crimeia era dele, Obama disse que não era e cada país do
mundo tomou um lado da briga que começou ano passado e parece que não termina
até essa rave acabar.
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