Alguém aí conhece Billy? Alguns de vocês provavelmente conhecem. Billy é um sujeito de primeira, aquele cara que todo mundo curte ter ao redor, coração grande, está sempre pronto para ajudar. Para mim e outros muitos, é um irmão por eleição.
Sob a ameaça de ser processado, eu tinha prometido a Billy que não ia contar essa história no blog. Há umas duas semanas, insisti tanto para que ele contasse o caso numa mesa de bar que acabei vencendo a parada. No dia seguinte, ele ficou transtornado e ameaçou cortar relações. Pois é, Billy The Kid, não consigo me segurar: já estou escrevendo sua história aqui. Nos vemos no tribunal.
Bom, Billy é hoje um empresário de sucesso. Junto com Misael, seu sócio, fundou e dirige a Norte – Ideias Planejadas, uma empresa de pesquisa e planejamento de comunicação que tem dado uma mexida no mercado. (Dei uma puxada de saco para ver se consigo um atenuante). Mas, por incrível que pareça, Billy já foi liso. Duro. Desfavorecido. Fugitivo de cigano. Negociador de juros do cartão C&A. Sem verba. Subsolo da pirâmide. Mais quebrado do que arroz de terceira.
Vamos à história.
Na época, nosso protagonista trabalhava em uma agência de Salvador no bairro de Ondina. Seu cargo: uma humilde cadeira na assistência de planejamento. Era o início da sua carreira na área, portanto, o salário não surpreendia. Apesar de muita empolgação, amor por seu ofício, garra e vontade de crescer, naquele momento, Billy era apenas mais um trabalhador brasileiro com quase nada no bolso e muita criatividade na cabeça.
E quando eu digo “quase nada”, acreditem: é “quase nada” mesmo. 23 reais para ser mais exato. Era fim de expediente e estava Billy na agência, quase desligando o computador, quando sobe a janela do MSN com a foto de uma figurinha repetida. A famosa marmita – assim eu chamaria, se fosse um cafajeste. Boas perspectivas para quem ia terminar um cansativo dia de meio de semana no zero a zero.
Papo vai, papo vem, marcaram no Caranguejo de Ondina. Confesso que programa mais romântico que esse eu não conheço. Desesperado, Billy saiu à caça de algum colega que pudesse lhe emprestar mais uns dois micos-leões-dourados ou quem sabe até uma onça. Frustração: todos já haviam saído. O único que ficou foi o segurança, mas este só tinha o vale-transporte de volta. Se tivesse também o de ida, Billy certamente o pediria emprestado.
Seguiu seu rumo, a pé, ele e seus trocados. Foi maquinando no caminho como faria para pagar a conta do bar e do leito redondo onde provavelmente encerraria sua noite. Chegou ao local e logo suou frio: sua companheira já o esperava com uma cerveja na mesa. Seria aquela a primeira garrafa? Teria ela pedido algo para comer? E se não houvesse jantado em casa? Naquele dia, Billy precisava tirar alguns coelhos da cartola.
Sentou-se. Ele se serviu da cerveja e notou que na garrafa sobrara, se muito, o suficiente para encher meio copo. Azar: o copo dela encontrava-se vazio.
- Garçom, outra – a voz sumia em meio ao pedido.
A conversa seguia, mas, nos porões da mente, Billy fazia contas: R$
Billy já pensava numa forma de encerrar prematuramente aquela conta de bar quando ela, má intencionada que estava, finalizou a segunda cerveja com certa velocidade. Desta vez, a amiga colorida nem esperou pelo cavalheiro. Animada, ordenou:
- Garçom, por favor, mais uma.
Agora já não era mais prioridade fechar a conta. Era necessidade. O consumo chegava a preocupantes 19 reais. Billy, num impulso inconsciente e desesperado, levou a mão à cabeça quando lembrou dos 10% do garçom - são nos momentos de grande dificuldade que os homens mostram sua retidão.
Total da farra: R$ 20,90.
- Fulana, eu larguei um arquivo na agência renderizando, preciso voltar lá urgente – disse Billy enquanto lançava repetitivos sinais para o garçom trazer a conta.
Saldo quitado. No bolso, uma nota de 2 reais e uma moeda de 10 centavos.
Foram até a agência. A pé. Como desculpa para a andança, ele havia dito que a lua – minguante, aquele dia – estava bonita demais, que era preciso apreciá-la. Chegou lá, entrou na agência, fingiu que fez alguma coisa e saiu novamente. A bebida inflamara a sua libido e Billy só conseguia pensar em uma coisa: como resolver a questão com 2 reais e 10 centavos na carteira?
A pé mais uma vez, foram para a praia de Ondina. Como morador do bairro, Billy conhecia algumas barracas de coco que, diante de necessidades como esta, serviam como ninho de amor aos desprovidos ou agoniados - Billy, naquela noite, era os dois. Chegando ao local, o clima esquentou ainda mais: estica daqui, puxa de lá e, de repente, a permanência deles ficou inviável em local público.
- Vamos pra algum lugar mais reservado? – perguntou Billy.
Com o consentimento da garota (que ainda parecia ter um pingo de juízo), partiram os dois para o ponto de ônibus. Sim, para o ponto de ônibus. Abro um parêntese para confessar a vocês que, se fosse eu, logo no início dessa odisséia, já teria desistido. Haja vontade. Mas, Billy é brasileiro e não desiste nunca.
Era início de madrugada e os dois embaixo da marquise, sentados no banco, um ao lado do outro, esperando a condução. Diferente da praia, agora estavam comportados. O ônibus chegou. Os dois entraram e, por conta das circunstâncias, Billy esqueceu por alguns instantes o cavalheirismo e passou na catraca empunhando apenas uma nota de 2 reais. Afinal, em seu bolso agora repousavam apenas 10 centavos. A sorte é que a garota tinha SmartCard e bancou sua passagem.
Pois se o dinheiro não estava dando para a passagem de ônibus, quanto mais para a conta do motel. Foi aí que, como se nada mais de negativo pudesse acontecer, o ônibus parou. “Não é possível, só falta ter quebrado” – pensou nosso herói. Mas, era algo ainda pior: uma blitz.
- Os homens pra fora, as mulheres permanecem sentadas – bradou um desses educados policiais ao subir no coletivo.
Junto com mais meia dúzia de gatos pingados, desceu Billy. Foi convidado a encostar as duas mãos na lateral do veículo e separar as pernas. Foi revistado, tomou o baculejo e qual não foi a surpresa do policial quando verificou que os únicos pertences do meu amigo eram um pente, um celular e 10 centavos. O lado bom é que, diante de tanta fartura, ninguém levantou suspeitas de que ele fosse um ladrão. Mas, o que eu achei mais bonito de tudo foi que Billy, após tantas adversidades, ainda encontrou dentro de si dignidade e romantismo para levantar os olhos para a janela do ônibus e, após um sorriso sublime, soltar um beijo para a moça. Ele com os braços para cima e as pernas abertas.
Viu? Pensem bem antes de reclamar da vida.
De volta ao ônibus, os dois seguiram abraçados, trocando inocentes carícias, até um ponto qualquer do Rio Vermelho. Saltaram e seguiram na direção do Motel Safári, uma espelunca de três andares, um motel vertical, emoldurado por um neon azul, bem em frente ao acarajé da Dinha. Ela, coberta de romantismo, feliz com seu príncipe encantado; ele, com seus 10 centavos no bolso, porém, pensando em deixar para resolver este problema no dia seguinte.
Pegaram um quarto. Amaram-se numa confortável cama de 10 parcelas de R$ 19,90 da Insinuante. No dia seguinte, bem cedo, Billy acordou e noticiou a sua falta de verba. Perguntou se ela tinha cartão e se ele poderia fazer um depósito na sua conta naquela semana. Sem problema. Então, despediram-se. Ela pegou um ônibus e ele foi andando para casa embaixo do sol escaldante. Do Rio Vermelho até a Ondina.
Sexta-feira passada, Billy me liga às 4:30 de uma tarde típica de verão baiano:
- Peter, estou aqui no restaurante do Yacht. Venha pra cá.
Respondi:
- Tá doido? Tô trabalhando. E você, por que não está fazendo o mesmo?
Billy, com a voz arrastada, num tom debochado, esclareceu:
- Empresário que é empresário não trabalha sexta à tarde...
Um dia ainda sigo os passos de meu amigo Billy. Refiro-me à folga numa sexta de sol; não a uma extensa noite no Motel Safári com 10 centavos no bolso.
17 comentários:
E Bob depositou o dinheiro na conta dela? rsrs
Jesus! Eu já vi gente tarada, mas Bob é insuperável! Foi até o fim! Agora... o beijinho que ele soltou durante a blitz deve ter sido uma visão dantesca...rs
Atualizar agora só daqui a uns dois meses, né? hehehe
Beijo!
Trankilo Bobby, Trankilo....rs
Bob, querido, você está certíssimo. Onde já se viu perder uma noite de amor por causa de falta de dinheiro... Não existe isso.
"Mas, o que eu achei mais bonito de tudo foi que Bob, após tantas adversidades, ainda encontrou dentro de si dignidade e romantismo para levantar os olhos para a janela do ônibus e, após um sorriso sublime, soltar um beijo para a moça."
Realmente muito lindo isso... Eu me apaixonaria por um desses tranquilamente. Hahahaha.
esse ai é diferenciado moderno...
em meios as gargalhadas,me veio uma dúvida,
será que ele fez o depósito???
rsssss
beijos,Pedro.
kkkkkk... vcs, homens, são engraçados demais!!!
Que bom que voltou a escrever!!!
Um milhao de beijos!
Bárbara já ouviu essa história???
Já que Bob tá podendo, bem que podia nos convidar para almoçar no Iate! Hahahahaha Ele é demais!!
Realmente que situação...
MEU DEUS!!!!!! Definitivamente não achei que vc fosse ter coragem de colocar essa história aqui. Vc ainda tá vivo?!? hahhahahhahahhahhahahha Coitadooooooooooooo... Peu, vc só esqueceu de contar o resto da história de amor com essa figura, afinal, não terminou ali, né?!? Hummmm... acho que vamos ter uma continuação rsrs... Bjsss
hahaha, fica todo mundo falando na tara do Bob, mas acho que a moça em questão tb deveria estar muito interessada, senão teria desistido no meio do caminho.
Bjos
"Quem dá aos pobres... paga o Motel!"
a curiosidade agora é pra saber qm eh o anónimo... mtooo boaaa essa euheuheuehe
engraçado... todo mundo de olho na tara do bob.
Pois é meu amigo, quem já não passou por um sufoco, pra dar uns amassos que atire a primeira pedra...
Essa mereceu o registro mesmo...
Abração
Envolvente história...Escreves divinamente bem!
Confesso que quando desci a rolagem e vi o tamanho fiquei meio desanimada, mas após ler um parágrafo, eu já não mais podia parar...
Espero que Bob pense melhor antes de convidar alguém para sair...rsrs
Um abraço
uma pena que vc largou o blog =/
Amigo Pedro,
Um ótimo NAtal pra você, cheio de alegrias e saúde!
Abração
Vavá
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