Existe um
filme – o meu preferido - que, se você ainda não viu, por favor, veja: Cinema
Paradiso. Lembro como se fosse hoje a primeira vez que o assisti. Eu tinha uns nove
ou dez anos de idade. O filme concorria ao Oscar e minha mãe fez questão de me
levar a tiracolo para conferir se a obra era mesmo tudo aquilo que diziam.
Entramos nós três na sala de exibição, eu, minha mãe e um grande saco de
pipoca. Foi naquele dia, diante da telona, que eu comecei a ter uma leve
compreensão sobre o sentimento mais misterioso que existe.
O filme
falava de um cara que, ainda muito jovem, tinha duas grandes paixões: o cinema
e uma garota. O amor desmedido que ele sentia pelos dois era fielmente
retratado no olhar do protagonista em cada cena, em cada gesto, em cada espera
e reencontro. O amor fazia-se notar. Um dia, a família da garota mudou-se de
cidade, foi embora e ela nunca mais voltou. A partir dali, era como se o rapaz morresse
em vida, como se o mundo passasse diante dos seus olhos em preto e branco. O
tempo correu e ele tornou-se um rico e famoso diretor, reconhecido pelo mundo
por conta do único amor que lhe restou: o cinema. Porém, já velho, trazia
consigo a infelicidade que só aqueles que carregam um coração vazio de fato conhecem.
Sua vida, incompleta, faltando o único pedaço que o tornava inteiro, era nada
menos do que um roteiro sem final feliz.
Está
gravado de forma cristalina em minha mente este dia. Eu, de frente para a luz
que saltava da tela, com o saco de pipoca quase intacto por conta de um nó que
travava a minha garganta, envergonhado de dar vazão ao que sentia, segurava o
choro com a clara sensação de que iria implodir. Então, o bem e o mal que
aquele cara viveu, tudo aquilo diante de mim, seria o amor? Era muita
intensidade, era encontro de céu e inferno na Terra. Pensei que jamais queria sentir
aquilo, preferia passar a vida brincando de Playmobil. Porém, entendi o recado,
percebi ali que amor é força incompreensível que constrói e que destrói com a
mesma competência, mas que também nos faz humanos.
Hoje, muito
tempo depois, olho à minha volta e me pergunto: onde foi parar todo esse sentimento
que encontrei naquele filme? Onde foi parar o morrer e viver por uma história? Cadê
gente desfazendo-se em cacos para depois renascer? O Tinder não permite isso, o
Happn também não. Pessoas vêm, pessoas vão, ocupam fragmentos de instantes,
levam e deixam retalhos de memórias. Abraços curtos, beijos também, viramos
zumbis do amor. Não nos entregamos, não nos estendemos, moramos cada vez mais em
nós mesmos. Escolhemos ficar onde dá pé, desistimos de mergulhar. E cada um de
nós, carentes de amar, seguimos na superfície, sem arriscar descobrir como é
bom, vez ou outra, se afogar.